Apesar do nome aparentemente complicado, trata-se de um problema bem simples de ser explicado. É um tipo de doença que atinge a córnea, do tipo ectasia, que consiste em uma dilatação anormal na qual a córnea expande sua curvatura de forma irregular e assume formato de cone. Em consequência disso, observamos o surgimento de astigmatismo com irregularidade, levando a pessoa a enxergar com distorção e também determina limitação para a eficiência das lentes esfero-cilíndricas de óculos. É importante ressaltar que apesar do ceratocone poder levar a uma acentuada perda de visão, raramente provoca a cegueira.
Agora que você já sabe do que se trata, vamos entender o que provoca essa doença e desencadeia este processo na córnea. O ceratocone ocorre por perda da rigidez do estroma da córnea, parte que corresponde a 90% da espessura corneal. Esta perda se dá em virtude de um processo de falência biomecânica aliada ao afinamento e deslocamento para frente da região central ou para-central da córnea. A doença é bilateral, ou seja, ocorre simultaneamente nos dois olhos e tem caráter progressivo. Porém, é comum que um dos olhos sofra mais ou menos essa mudança na córnea, de maneira assimétrica. Geralmente, este processo tem início na adolescência, afetando um maior número de mulheres do que os homens, e evolui até 30 ou 35 anos, quando é comum ocorrer uma desaceleração do processo e estabilização natural do quadro. O diagnóstico de ceratocone envolve exame oftalmológico completo e exames complementares para caracterização da córnea.
Uma curiosidade: A incidência do ceratocone na população é de 1 caso para cada 2.000 pessoas, atingindo uma porcentagem de 0,05%. Porém, essa estatística parece maior ao aplicarmos estudos de screening, que são exames realizados em pessoas sem qualquer tipo de sintoma para a identificação presuntiva de doença, chegando a 6% das pessoas com interesse em realizar cirurgia refrativa.
EXISTEM SINTOMAS? QUAIS SÃO?
Sim! Você pode ficar atento caso sinto os sintomas a seguir: O principal é o embaçamento e distorção da visão. Em geral, ocorre intensificação de miopia e astigmatismo, provocando a necessidade de trocas mais frequentes de óculos, que deixam de fornecer uma visão adequada devido à irregularidade, de acordo com a progressão da doença. O ceratocone é tipicamente uma doença que não provoca dores e não apresenta quadro inflamatório (não deixa o olho vermelho). Devido a grande associação com alergia nos olhos, ela provoca coceira. Apesar de todos os sintomas descritos anteriormente, o ceratocone pode ser diagnosticado em fase inicial da doença em pacientes que não apresentam sintomas ou queixas
EXISTE PREVENÇÃO PARA O CERATOCONE?
Infelizmente, não existem meios de prevenir o surgimento do ceratocone. É um tipo de doença que une fatores hereditários e genéticos, porém ainda não há testes genéticos para diagnóstico. A progressão do ceratocone está relacionada ao trauma contínuo, ou seja, hábito de coçar os olhos deve ser evitado, pois é o fator de risco mais bem definido para o aparecimento ou agravamento da doença. O diagnóstico em fases precoces da doença ou a identificação de indivíduos mais susceptíveis (com maior predisposição) é importante para direcionar a orientação para não coçar os olhos e tratar a alergia ocular que pode estar associada ao problema.
TRATAMENTOS
Assim como em muitas outras doenças, o tratamento é realizado de acordo com o estágio da doença, com o grau de irregularidade existente na córnea e com características gerais de cada pessoa. É necessário ressaltar a importância do tratamento da alergia dos olhos e a orientação de não coçar os olhos, que é fundamental.
Na fase inicial da doença, o uso de óculos pode restabelecer a visão de forma eficiente e prover maior qualidade de vida. Em fases mais avançadas, devido à progressão da irregularidade na córnea, os óculos não são mais eficientes. Nessa fase, a utilização de lentes de contato especiais é ainda capaz de promover boa visão.
Nos casos em que nem os óculos, ou lentes de contato consigam proporcionar uma visão satisfatória, é indicado o tratamento cirúrgico. Outra indicação de cirurgia seria a progressão da doença documentada por exames sequenciais.
CIRURGIA
O tratamento cirúrgico era exclusivamente o transplante de córnea até meados dos anos 1990. Entretanto, há cirurgias alternativas que podem ser indicadas para o ceratocone com diferentes objetivos em diferentes fases da doença, veja abaixo:
Cirurgias para Ceratocone
- Crosslinking do Colágeno
- Ablação de Superfície Personalizada
- Implante de Segmento(s) de Anel Intra-corneano
- Implante de Lente Intraocular (LIO) Fácica
- Transplante Penetrante de Córnea
- Transplante Lamelar de Córnea
Conheça mais sobre cada tipo de cirurgia.
Em 1996, foi descrito o uso de segmentos de anel para implante intra-corneano (SAIC) com o objetivo de regularização e aplanamento da córnea. O oftalmologista brasileiro de Belo Horizonte, Dr. Paulo Ferrara, e o francês de Bordeaux, Dr. Joseph Colin, foram os primeiros a descrever, de forma independente, o uso de anel para ceratocone.
No final da década de 90, o grupo do Prof. Theo Seiler em Dressden, Alemanha, descreveu o tratamento para promoção de ligações covalentes no colágeno do estroma da córnea (crosslinking), que consiste na aplicação de radiação ultravioleta sobre a córnea embebida em vitamina B2 com o objetivo de aumentar a rigidez do tecido e, com isso, estabilizar a doença (ectasia).
A ablação, retirada da superfície protuberante (ASA) personalizada por excimer laser (radiação luminosa especial que possibilita fazer um micro polimento da superfície da córnea) pode ser indicada para regularização da superfície da córnea, com o objetivo de reduzir o astigmatismo irregular, ou seja, significa retirar a parte da córnea que está projetada para frente e normalizar o perfil dela. A mesma cirurgia é comumente aplicada na correção visual a laser para tratamento refrativo nos casos de miopia, hipermetropia e astigmatismo, com o objetivo de reduzir a dependência de correção visual por uso óculos ou lentes de contato. Entretanto, o objetivo da ablação de superfície personalizada para ceratocone deve ser diferenciado. Nesse caso, o objetivo é apenas terapêutico, não influindo na correção do grau de refração, mas sim a redução da irregularidade da córnea, possibilitando melhor visão, mas ainda corrigida por uso óculos.
A combinação da ablação de superfície personalizada com o crosslinking (aplicação de radiação ultravioleta sobre a córnea embebida em vitamina B2) é denominada como Protocolo de Atenas e foi descrita pelo oftalmologista grego Dr. John A. Kanellopoulos.
O implante de LIO fácica (LENTE INTRAOCULAR FÁCICA) é indicado para pacientes com altos graus de miopia e hipermetropia, pois seu desempenho é capaz de corrigir miopias de até 23 graus e hipermetropias de até 21 graus, além de astigmatismo. Geralmente, esta cirurgia está ligada aos casos de anisometropia (diferença de grau entre os olhos), mas pode ser realizada como alternativa a correção por óculos e lentes de contato de forma eletiva (opcional).
Dependendo do caso, estes procedimentos podem ser combinados em um mesmo paciente, sem qualquer agente complicador.
Caso o estágio de ceratocone esteja muito avançado e não seja possível nenhum desses procedimentos, aí então fica nítida a necessidade de transplante de córnea. É importante ressaltar que após o transplante o paciente passa a ter “vida nova”, ou seja, requer uma rotina de cuidados especiais. E o fato de ter realizado o transplante não significa que a doença não possa ocorrer novamente.
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